Prelo
Prelo
O escritor fora: crônica da mudança e lembrança de Roberto Bolaño
#127 – Eles estão por fora.
Não participam. Fazem questão de não saber. Estão envolvidos com suas próprias coisas. Absorvidos por sua militância particular.
São indiferentes à polêmica mais circunstancial, ao sobe e desce dos palanques, dos congressos do ofício. “Você viu?” “Soube do que disse ele, do que disse ela?” Não, não sabem. Você vai ter de contar. As colunas do jornal? O lançamento blockbuster, aquele debate em que todo mundo irá se envolver por vinte e cinco dias corridos? Ele ouviu falar qualquer coisa, sim. Você lhe conta, ele opina. Segue, e é isso.
E esquece do assunto, assim como você se esquece dele.
Uns constroem devagar sua biblioteca. Veem os pais envelhecer. Participam dos aniversários.
E há esses outros, dos quais temos poucas notícias.
Foi sua escolha, afinal. Ele partiu. Pode voltar uma, outra, uma infinidade de vezes. Mas nosso amigo, nossa amiga, parecem não se contentar com a novela cotidiana dos conhecidos e familiaridades.
É uma escolha difícil: afinal, a trama social é o que nos sustenta. É o outro que nos oferece os parâmetros. O espaço-tempo, são os outros que ancoram.
Eles talvez vivam em um tempo sem tempo, em um lugar sem lugar. Quem sabe?
De quem estamos falando? Ora.
É do fotógrafo que passa as noites fumando, resmungando em mandarim, jogando mahjong e tirando fotos dos becos escuros de Xangai. É a bióloga que investiga o comportamento dos fungos que nascem depois dos incêndios em Oaxaca. É o músico do cruzeiro transatlântico, que aprende a viver sobre as águas, e que se sente só apenas quando volta para casa.
Estamos falando das escritoras e dos escritores que não participam do meio. Que estão em outro lugar, fazendo um bolo e tomando um café em um sítio, cuidando da sua horta. Vão começar agora a leitura de um livro que descobriram em uma livraria de bairro e do qual quase ninguém ouviu falar.
Estou falando de escrita, de viagem, de algo maior que a literatura.